quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Padrão dos Centenários - Alto da Freita -Serra do Marão



O Padrão Comemorativo dos Centenários da Pátria

Alto da Freita – Serra do Marão – Campeã

Em Setembro de 1939 Hitler iniciou as operações militares contra a Polónia.
A Inglaterra e a França, não conseguindo obrigar Hitler a recuar, declararam guerra à Alemanha.
Em Maio de 1940, Hitler invade a Bélgica, Holanda e Luxemburgo e em 14 de Junho os Alemães entram em Paris.
Assim começa e desenvolve-se a 2ª grande Guerra Mundial. Na Europa vivem-se tempos de incerteza, constrangimentos e retracção.

Em Portugal, a estabilidade conseguida através do poder autoritário, proporciona que no ano de 1940, o Estado Novo atinja o seu apogeu.
Com o fim de comemorar o oitavo centenário da Independência Nacional (1143) e o terceiro da Restauração (1640), o regime organizou uma grandiosa Exposição do Mundo Português, nos terrenos marginais do Tejo junto ao Mosteiro dos Jerónimos e à Torre de Belém.
As festas dos centenários que se estendem por todo país, abrem no princípio de Junho de 1940.
Recupera-se património, em especial o Castelo de Guimarães, publicam-se livros e realizam-se filmes, usa-se o teatro e as peças de revistas para enaltecer os feitos históricos dos antepassados.

Em Vila Real, o Governador Civil, Tenente Horácio de Assis Gonçalves, também quis associar a região transmontana à efeméride, mandando elaborar o projecto do “Padrão Comemorativo dos Centenários da Pátria” a colocar no Alto da Freita, agulha mais saliente e altaneira da recortada Crista do Marão com os seus 1415 mts de altitude, na freguesia de Campeã, sobranceiro ao grande pórtico de entrada na Província de Trás-os-Montes, o rompimento do Alto de Espinho.
Juntou esforços, grandes e pequenas dádivas, obteve apoios de todas as Câmaras Municipais do Distrito e da Junta da Província.
Reuniu com os representantes das freguesias do Marão, pediu aos párocos para através da missa dominical apelar às contribuições dos povos da Serra, toda a ajuda seria preciosa: dinheiro, dias de trabalho, cedência de carros e juntas de bois.
Solicitou apoios especiais aos concessionários das minas de volfrâmio e estanho da Serra: Minas do Ramalhoso; Minas das Rodas do Marão; do Ramalhal; da Tapada de Frieiras; da Portela da Gaiva; do Pedrado; do Monte Figueira; do Teixo e de Maria Isabel. Relembrou que seriam necessários cabedais (moeda) e em especial a cedência de homens experimentados no manejo de rastilho e pólvora para extracção da pedra dos fragões.
Mandou contactar serradores e carpinteiros de primeira, conhecidos por “Biscainhos da Galiza”, que estavam a trabalhar na construção da moderna siderurgia a instalar na rechã do Vale da Campeã, na Sardoeira.


Este projecto e proposta colectiva entusiasmou todas as gentes, em especial os pobres lavradores e jornaleiros das proximidades, teriam oportunidade de juntar uns cobres aos parcos rendimentos da batata e da castanha.
Contente andava o velho Estraminé, sardinheiro do lugar da Boavista, contratado para abastecer de sardinhas salgadas em barricas os pedreiros da obra.
Muito satisfeitas ficaram as doceiras da Teixeira com as encomendas do saboroso doce, que iria chegar ao Pico da Freita nas cestas de castanho nos dorsos dos machos dos almocreves.
O ferreiro, “Barulho” de alcunha, também esfregava as mãos de contentamento, reforçando até as encomendas de carvão para a forja. Além do aumento das receitas, via forma de mostrar a qualidade da tempera que só ele sabia dar aos picos, aos ferros, e ponteiros usados na exploração e aparelhamento da pedra xistosa.
Feliz e ansioso andava o Senhor Abade Lemos, teria mais um Templo para celebrar missas à Nossa Senhora da Serra com a intenção que a chuva aparecesse. Já sonhava com a grande cerimónia de inauguração e consagração, preparando um grupo coral, também já contemplava no altar as toalhas de armar em linho alvo com bainhas abertas executadas sábia e pacientemente pelas tecedeiras de Viariz da Poça.

Durante o Verão o projecto avançou com rapidez e entusiasmo.
Na cerimónia de colocação da “Primeira Pedra” referiu o Sr. Governador:
O Padrão comemorativo dos Centenários da Pátria, erguer-se-há nas cumeadas do Marão, para dominar montes e vales e aqui ficar, como um sinal do nosso tempo.
Neste monumento Histórico, que prevemos singular, se simbolizará, com exuberância e perfeição, pelo plano elegante do projecto e traça artística que comporta, um passado de Oito Séculos, cuja grandeza e vigor os tempos se habituaram a respeitar…
Padrão de transmontanos, monumento votivo do passado glorioso da Pátria, pensado por transmontanos, saído de mãos transmontanas e construído com materiais de Trás-os-Montes, é obra de arquitectura que o consagrado talento de Baltazar de Castro animou e Rogério de Azevedo soube traduzir em salientes traços de mestria….
Altar e Padrão dos transmontanos.. nele se conjugarão o “medieval” da Fundação, com o “moderno” da Renovação, estreitamente ligadas pelo “religioso””.

Os trabalhos prosseguiram com afinco, fizeram-se medições e estabeleceram-se cotas. Implantou-se a obra no terreno, escavaram-se fundações e alicerces, construíram-se as primeiras paredes, mas a chegada rápida do Inverno obrigou à suspensão da construção.
Pior do que o Inverno rigoroso do Marão, com ventos ciclónicos, neves altas e duradouras, o gelo transformado em cinzel, foram as trevas que a Europa teve de enfrentar.
A guerra continuava cada vez mais horrorosa e mortífera. Os combates encarniçados desenvolviam-se por quase todo o Continente. Aliados e Alemães perdiam milhares de carros de combate, aviões, e todo o tipo de armamento, era necessário reforçar a produção nas fábricas e a extracção de matérias-primas nas minas.
Os mineiros tiveram de trabalhar dia e noite para satisfazer as grandes encomendas que chegavam dos dois lados da guerra.
Toda a produção era escassa para o fabrico de armas e munições.



O preço do “volfro” e do estanho disparou em flecha.
Mineiros, concessionários, intermediários, contrabandistas locais e internacionais rejubilaram com a negociata.
Esta fortuna fácil atraiu homens Maroneses que descobriram nas entranhas da Serra a riqueza negra do volfrâmio. Para lá se precipitaram esquecendo a pele da terra donde só com suor e canseira algum proveito brotava. De bom grado se lançaram nesta perene aventura que lhes prometia incontáveis riquezas.
Muitos dos camponeses trocaram a enxada pela picareta, esventraram as escombreiras do Marão, fazendo “garimpa”, prospecção individual, frequentemente ilícita, enfrentando as forças da ordem, vendendo a Aliados e Alemães.
Outros roubam minério, o “ouro negro”, ou entram para as redes de contrabando.
É a vaga dos novos-ricos desfazendo fortunas ao ritmo que as ganham.
Conta-se que chegavam a fabricar cigarros usando como papel de “mortalha” as notas do Banco de Portugal, outros davam-se ao luxo de acompanhar a malga de caldo com pão-de-ló.
Histórias que são testemunhas os cumes da serra onde nasce e morre a esperança.

A 2º Grande Guerra Mundial prolongou-se até 1945.
Em Portugal, a época das comemorações já tinha ficado para trás. Agora os interesses e prioridades estavam voltados para as obras públicas, para o desenvolvimento industrial na periferia das grandes cidades, mantendo as populações rurais do interior um atraso de estagnação agrícola e económica, avizinhava-se a saída em massa da população rural para o estrangeiro onde procurava melhores condições de trabalho e de vida.
O Padrão do Centenário ficou-se pelas paredes iniciais…
Hoje, no Alto da Freita, no “Grande Marão que não dá palha nem grão” encontramos dois gigantes aero-geradores, que produzem energia eólica para nos iluminar e aquecer, valendo milhões de Euros, e um Posto de Vigia, munido de uma luneta de longo alcance com deslumbrante panorama sobre a vertente oriental do Marão. Sinal dos Tempos.

                                                                                 
Hilário Néry de Oliveira


Fontes:

- Jornal “A Hora” – Tomo I

- Portugal Século XX - Círculo Leitores

- História de Portugal – Círculo Leitores

- A Segunda Guerra Mundial – Círculo Leitores

- Recolha Oral: Entrevistas a Velhos Mineiros

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