O Padrão Comemorativo dos Centenários da Pátria
Alto da
Freita – Serra do Marão – Campeã
Em Setembro de
1939 Hitler iniciou as operações militares contra a Polónia.
A Inglaterra e
a França, não conseguindo obrigar Hitler a recuar, declararam guerra à Alemanha.
Em Maio de
1940, Hitler invade a Bélgica, Holanda e Luxemburgo e em 14 de Junho os Alemães
entram em Paris.
Assim começa e
desenvolve-se a 2ª grande Guerra Mundial. Na Europa vivem-se tempos de
incerteza, constrangimentos e retracção.
Em Portugal, a
estabilidade conseguida através do poder autoritário, proporciona que no ano de
1940, o Estado Novo atinja o seu apogeu.
Com o fim de
comemorar o oitavo centenário da Independência Nacional (1143) e o terceiro da
Restauração (1640), o regime organizou uma grandiosa Exposição do Mundo
Português, nos terrenos marginais do Tejo junto ao Mosteiro dos Jerónimos e à
Torre de Belém.
As festas dos
centenários que se estendem por todo país, abrem no princípio de Junho de 1940.
Recupera-se
património, em especial o Castelo de Guimarães, publicam-se livros e
realizam-se filmes, usa-se o teatro e as peças de revistas para enaltecer os
feitos históricos dos antepassados.
Em Vila Real,
o Governador Civil, Tenente Horácio de Assis Gonçalves, também quis associar a
região transmontana à efeméride, mandando elaborar o projecto do “Padrão Comemorativo dos Centenários da
Pátria” a colocar no Alto da Freita, agulha mais saliente e altaneira da
recortada Crista do Marão com os seus 1415 mts de altitude, na freguesia de
Campeã, sobranceiro ao grande pórtico de entrada na Província de
Trás-os-Montes, o rompimento do Alto de Espinho.
Juntou
esforços, grandes e pequenas dádivas, obteve apoios de todas as Câmaras
Municipais do Distrito e da Junta da Província.
Reuniu com os
representantes das freguesias do Marão, pediu aos párocos para através da missa
dominical apelar às contribuições dos povos da Serra, toda a ajuda seria
preciosa: dinheiro, dias de trabalho, cedência de carros e juntas de bois.
Solicitou
apoios especiais aos concessionários das minas de volfrâmio e estanho da Serra:
Minas do Ramalhoso; Minas das Rodas do Marão; do Ramalhal; da Tapada de
Frieiras; da Portela da Gaiva; do Pedrado; do Monte Figueira; do Teixo e de
Maria Isabel. Relembrou que seriam necessários cabedais (moeda) e em especial a
cedência de homens experimentados no manejo de rastilho e pólvora para
extracção da pedra dos fragões.
Mandou
contactar serradores e carpinteiros de primeira, conhecidos por “Biscainhos da Galiza”, que estavam a
trabalhar na construção da moderna siderurgia a instalar na rechã do Vale da
Campeã, na Sardoeira.
Este projecto
e proposta colectiva entusiasmou todas as gentes, em especial os pobres
lavradores e jornaleiros das proximidades, teriam oportunidade de juntar uns
cobres aos parcos rendimentos da batata e da castanha.
Contente
andava o velho Estraminé, sardinheiro
do lugar da Boavista, contratado para abastecer de sardinhas salgadas em
barricas os pedreiros da obra.
Muito
satisfeitas ficaram as doceiras da Teixeira com as encomendas do saboroso doce,
que iria chegar ao Pico da Freita nas cestas de castanho nos dorsos dos machos
dos almocreves.
O ferreiro, “Barulho” de alcunha, também esfregava as
mãos de contentamento, reforçando até as encomendas de carvão para a forja. Além
do aumento das receitas, via forma de mostrar a qualidade da tempera que só ele
sabia dar aos picos, aos ferros, e ponteiros usados na exploração e
aparelhamento da pedra xistosa.
Feliz e
ansioso andava o Senhor Abade Lemos, teria mais um Templo para celebrar missas
à Nossa Senhora da Serra com a intenção que a chuva aparecesse. Já sonhava com
a grande cerimónia de inauguração e consagração, preparando um grupo coral,
também já contemplava no altar as toalhas de armar em linho alvo com bainhas
abertas executadas sábia e pacientemente pelas tecedeiras de Viariz da Poça.
Durante o
Verão o projecto avançou com rapidez e entusiasmo.
Na cerimónia
de colocação da “Primeira Pedra” referiu o Sr. Governador:
“O Padrão comemorativo dos Centenários da Pátria, erguer-se-há nas
cumeadas do Marão, para dominar montes e vales e aqui ficar, como um sinal do
nosso tempo.
Neste monumento Histórico, que prevemos
singular, se simbolizará, com exuberância e perfeição, pelo plano elegante do
projecto e traça artística que comporta, um passado de Oito Séculos, cuja grandeza
e vigor os tempos se habituaram a respeitar…
Padrão de transmontanos, monumento votivo do
passado glorioso da Pátria, pensado por transmontanos, saído de mãos
transmontanas e construído com materiais de Trás-os-Montes, é obra de
arquitectura que o consagrado talento de Baltazar de Castro animou e Rogério de
Azevedo soube traduzir em salientes traços de mestria….
Altar e Padrão dos transmontanos.. nele se conjugarão o “medieval” da
Fundação, com o “moderno” da Renovação, estreitamente ligadas pelo “religioso””.
Os trabalhos
prosseguiram com afinco, fizeram-se medições e estabeleceram-se cotas. Implantou-se
a obra no terreno, escavaram-se fundações e alicerces, construíram-se as
primeiras paredes, mas a chegada rápida do Inverno obrigou à suspensão da
construção.
Pior do que o
Inverno rigoroso do Marão, com ventos ciclónicos, neves altas e duradouras, o
gelo transformado em cinzel, foram as trevas que a Europa teve de enfrentar.
A guerra
continuava cada vez mais horrorosa e mortífera. Os combates encarniçados desenvolviam-se
por quase todo o Continente. Aliados e Alemães perdiam milhares de carros de
combate, aviões, e todo o tipo de armamento, era necessário reforçar a produção
nas fábricas e a extracção de matérias-primas nas minas.
Os mineiros
tiveram de trabalhar dia e noite para satisfazer as grandes encomendas que
chegavam dos dois lados da guerra.
Toda a produção era escassa para
o fabrico de armas e munições.
O preço do “volfro” e do estanho disparou em flecha.
Mineiros,
concessionários, intermediários, contrabandistas locais e internacionais
rejubilaram com a negociata.
Esta fortuna
fácil atraiu homens Maroneses que descobriram nas entranhas da Serra a riqueza
negra do volfrâmio. Para lá se precipitaram esquecendo a pele da terra donde só
com suor e canseira algum proveito brotava. De bom grado se lançaram nesta
perene aventura que lhes prometia incontáveis riquezas.
Muitos dos camponeses
trocaram a enxada pela picareta, esventraram as escombreiras do Marão, fazendo “garimpa”, prospecção individual,
frequentemente ilícita, enfrentando as forças da ordem, vendendo a Aliados e
Alemães.
Outros roubam
minério, o “ouro negro”, ou entram
para as redes de contrabando.
É a vaga dos
novos-ricos desfazendo fortunas ao ritmo que as ganham.
Conta-se que
chegavam a fabricar cigarros usando como papel de “mortalha” as notas do Banco de Portugal, outros davam-se ao luxo de
acompanhar a malga de caldo com pão-de-ló.
Histórias que
são testemunhas os cumes da serra onde nasce e morre a esperança.
A 2º Grande
Guerra Mundial prolongou-se até 1945.
Em Portugal, a
época das comemorações já tinha ficado para trás. Agora os interesses e
prioridades estavam voltados para as obras públicas, para o desenvolvimento
industrial na periferia das grandes cidades, mantendo as populações rurais do
interior um atraso de estagnação agrícola e económica, avizinhava-se a saída em
massa da população rural para o estrangeiro onde procurava melhores condições
de trabalho e de vida.
O Padrão do
Centenário ficou-se pelas paredes iniciais…
Hoje, no Alto
da Freita, no “Grande Marão que não dá
palha nem grão” encontramos dois gigantes aero-geradores, que produzem
energia eólica para nos iluminar e aquecer, valendo milhões de Euros, e um
Posto de Vigia, munido de uma luneta de longo alcance com deslumbrante panorama
sobre a vertente oriental do Marão. Sinal dos Tempos.
Hilário Néry de Oliveira
Fontes:
- Jornal “A Hora” – Tomo I
- Portugal Século XX - Círculo
Leitores
- História de Portugal – Círculo
Leitores
- A Segunda Guerra Mundial –
Círculo Leitores
- Recolha Oral: Entrevistas a
Velhos Mineiros
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